No divórcio, só pode identificar e dividir os bens que conhece. É, portanto, pressuposto identificar com rigor qual o património existente, seja ele comum ou próprio.
É possível lançar mão de um meio processual muito eficaz e célere, designada ‘arrolamento’. No entanto, mesmo se pretender utilizar este expediente para evitar o desaparecimento de património comum é importante que tenha uma noção dos bens existentes.
Por estas razões, é essencial para si, quando pressente o descaminho da sua relação, obter o máximo de informações financeiras: contas bancárias e respetivos números, extratos dessas contas, códigos de cofres, ações existentes, bens mais valiosos, como joias e telas de pintores valorizados no mercado, e por aí fora.
Seja como for, avalie também o impacto estratégico que a interposição de um arrolamento origina. Isso implica ‘guerra’. Discuta com o seu advogado os prós e os contras de utilizar este expediente. Porventura, uma abordagem mais suave poderá, a médio prazo, ser-lhe mais favorável. Um pensamento, no entanto, deve estar sempre presente: não misture a montanha-russa das emoções com a divisão do património.
Além da identificação dos bens, deve ainda ter o cuidado de saber com rigor qual o seu valor de mercado. Faça isso, em particular, para os mais importantes. É que, por regra, nomeadamente, quando há um valor considerável a dividir, não há grandes preocupações neste ponto. Ora, isso pode ser um erro crasso. Bens que pensava valerem pouco e afinal valem muito. E outros, que pensava valerem muito e, afinal, valem pouco.
Vários especialistas estão ao seu dispor para tratar deste assunto: avaliadores oficiais, mediadores, auditores, peritos, entre outros.
Fase da identificação dos bens:
- Identifique rapidamente qual o património existente (seja comum seja próprio)
- Reúna com o seu advogado para compreender quais os bens comuns e quais os bens próprios
- Analise a informação patrimonial que recolheu
- Contrate especialistas que lhe dirão qual o valor de mercado dos bens mais relevantes
- Tome decisões, com o apoio do seu advogado.
Na fase de recolha da informação deve apenas concentrar-se nisso, mesmo que não compreenda, com rigor, qual o seu impacto. Esse momento é crítico.
Tenha particular cuidado com certos comportamentos do outro cônjuge, porque indicam uma eventual tentativa de ocultação de bens. Tome nota do seguinte:
- Levantamentos e transferências injustificadas: é possível que o seu cônjuge, antecipando a situação de partilha, esteja a retirar dinheiro das contas bancárias ou a vender títulos ou outros ativos, ocultando o rasto ao dinheiro recebido.
- Contas bancárias em nome de terceiros, normalmente familiares: é frequente a existência de contas em nome de um filho ou em nome de um dos pais do seu cônjuge. Quer o seu filho quer os pais do seu cônjuge são terceiros em relação a si. No entanto, o dinheiro que lá está também é seu, apesar das contas estarem em nome desse terceiro. É o seu cônjuge que as movimenta, fazendo delas o que entende.
- Descontos na folha de vencimento: uma forma simples de esconder patrimônio, quando se tem uma relação de confiança com a entidade patronal, é a de lhe pedir para efetuar descontos no vencimento que, na realidade, não têm fundamento.
- Resistência em facultar informação: é um péssimo sinal se o outro cônjuge lhe levanta inúmeras dificuldades para aceder a informações financeiras relacionadas com bens que são de ambos.
- Informação empresarial contraditória: tem de ter particular atenção às situações em que o outro cônjuge controla uma empresa. Na verdade, por via da empresa, ele pode estar a esconder patrimônio. Por ex., aumentando os custos (pagando salários a pessoas da sua confiança, comprando bens que não se justificam, em particular, para uso pessoal), ou diminuindo as receitas (não faturando vendas, adiando negócios…). Nestas situações, muito técnicas, importa ter a ajuda de um especialista em contabilidade, economia ou gestão. Ele também será útil para determinar qual o valor de valorização do negócio desde o seu casamento até aos dias de hoje.
Existam ou não dificuldades na recolha dos dados pretendidos, deve fazer um mapeamento da informação financeira que lhe pode ser disponibilizada junto das seguintes fontes.
Fontes de recolha de informação:
- Declarações fiscais – Os dados recolhidos nestas declarações são muito relevantes, porque são oficiais. Para ter acesso aos mesmos pode consultar o Portal das Finanças.
- Acordo antenupcial – Este documento é assinado na altura em que se formaliza o casamento. Reveja se existe algum acordo sobre o regime de bens. Ele é essencial para perceber quais as regras que tem de aplicar na partilha.
- Comprovativos de compra com datas anteriores ao casamento (faturas, escrituras, contratos…) – Tendo feito aquisições de bens antes do casamento é a altura de procurar os respetivos comprovativos.
- Testamentos – Este documento faculta-lhe informação sobre o património adquirido gratuitamente, no caso de ser beneficiário do mesmo.
Também é muito importante considerar o testamento que já fez ou o do outro cônjuge
- Contratos de sociedade – No caso de existirem participações em sociedades (sociedades por quotas ou sociedades anónimas), importa obter informações sobre elas assim como as respetivas contas. Essas informações estão disponíveis na Conservatória do Registo Comercial.
Se foram constituídas offshore a situação torna-se mais difícil. Deve recolher o máximo de informação sobre isso e facultá-las ao seu advogado, que ele saberá como agir.
- Folhas de vencimento – Comprovativo do vencimento mensal pago pela entidade patronal.
- Fringe benefits – Quais são e qual o respetivo valor. Eles, por regra, consistem na atribuição de veículo, telemóvel, prémios, bónus, seguros de saúde, stock options, entre outros. Normalmente, constam de um documento emitido pela entidade patronal (folha de vencimento) ou da declaração de IRS.
- Extratos recentes consolidados de contas bancárias – Os extratos consolidados atualizados dos bancos identificam as contas e demonstram quais os ativos existentes, sejam eles aplicações financeiras ou não, e ainda os passivos dos quais há responsabilidades, tanto de médio/longo prazo (crédito à habitação) como a curto prazo (cartões de crédito).
Se não tem acesso a extratos consolidados, peça-os junto do balcão do banco ou consulte-os no site.
- Extratos recentes de contas em empresas de intermediação de títulos – Por vezes a compra e venda de ações efetua-se junto de empresas que negoceiam títulos na Bolsa. Importa ter acesso a este tipo de extratos. Veja se há algum relacionamento com este tipo de empresas.
- Seguros (PPR’s, e outros instrumentos de capitalização) – Recolha informação junto das suas seguradoras e bancos para saber se tem seguros de capitalização, isto é, basicamente, poupanças.
Também deve ter conhecimento da existência e das condições de seguro de vida e de acidentes pessoais relativos a todo o agregado familiar.
- Seguros de saúde – Confirmar, junto das seguradoras com quem se relaciona, a proteção que é facultada, quais os beneficiários e custos. Se beneficia de sistemas de saúde públicos recolhe os dados relativos às condições gerais de acesso.
- Certificados de aforro – Obtenha um extrato junto da entidade intermediadora deste tipo de aplicações.
- Pensões – Saiba, junto da Segurança Social ou de outra entidade para onde foram efetuados descontos, quais os montantes transferidos e o regime que se aplica a esses montantes.
Tenha também em conta os valores descontados para instituições internacionais, quando exerceu atividade remunerada fora de Portugal.
Considere ainda se existem Certificados de Reforma.
- Outros:
- Imóveis — Conservatória do Registo Predial.
- Automóveis, motociclos — Conservatória do Registo Automóvel.
- Aeronaves — Autoridade Nacional da Aviação Civil.
- Embarcações de recreio — Autoridade Marítima Nacional (Capitania).
- Embarcações mercantes — Certidão do Registo Comercial.
- Joias e antiguidades — Fotografias.
- Obras de arte — Fotografias.
- Contratos — cópias.
- Atividade empresarial — cópias.
- Crédito de milhas para voar — extrato do cartão que acumula milhas.
ATENÇÃO: A falta de colaboração do outro cônjuge na identificação de bens pode ser punida, no âmbito de um processo judicial, pelo tribunal.
Peça orientação junto de um advogado. Por vezes, basta uma reunião para compreender que procedimentos deve adotar. Verá que tudo correrá muito melhor.