O mecanismo mais seguro ainda é o do desconto no vencimento. Para isso, é necessário que o progenitor devedor tenha uma entidade patronal. No entanto, mesmo nestas circunstâncias, nada impede o progenitor de deixar de trabalhar e, consequentemente, deixar de pagar.
Para o progenitor credor se encontrar numa situação relativamente frágil é muito relevante encontrar mecanismos que limitem essa fragilidade. Por isso, considere a provisão por alimentos, a garantia bancária e, ainda, o desconto automático no vencimento.
Mas, apesar de todas as cautelas, o progenitor não pagou. Agora vai ter de resolver mais este problema.
Alguns sinais de que se aproxima esse momento são típicos:
- O pagamento é feito junto de si — o progenitor devedor já várias vezes disse que iria começar a fazer os pagamentos por transferência bancária. No entanto, nunca concretizou tal intenção.
- Atrasos constantes no pagamento — o progenitor devedor nunca efetua o pagamento no dia previsto. Só paga depois de várias vezes avisado da falta de pagamento.
- Paga no prazo mas apenas parte do que deve — o progenitor remete ao outro os comprovativos das despesas variáveis. Mas, o progenitor devedor só paga o valor fixo da pensão.
- Mudanças frequentes de emprego — quando têm como único propósito dificultar a identificação da entidade patronal.
- Histórico de incumprimento — quando o progenitor já tem um conjunto de situações reportadas ao Banco de Portugal por falta de pagamento de prestações relativas a empréstimos ou de cheques emitidos e devolvidos por falta de provisão
ATENÇÃO Não aguarde mais de 15 dias a contar da data em que o pagamento deveria ter sido efetuado. Reaja depois desse período se ter esgotado. Poderá, por si própria, apresentar uma petição ao tribunal ou, então, falar com o seu advogado. Quanto mais tempo demorar a reagir mais difícil se torna a cobrança do crédito. Nunca se esqueça que está a fazer isso pelo seu filho e não por si. E o seu filho pede-lhe isso.
Peça a intervenção do tribunal
Apesar das suas insistências e boa vontade, o certo é que o progenitor devedor não paga. Ora, não vale a pena adiar o inadiável. A única forma de obrigar o devedor a pagar a pensão de alimentos é por intermédio do tribunal. Faça-o o quanto antes.
Existem vários caminhos para obrigar o outro a pagar.
MECANISMOS PARA EXIGIR JUDICIALMENTE O PAGAMENTO |
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TIPO | DESCRIÇÃO |
Incumprimento | Exposição dirigida ao tribunal onde se relatam os factos sobre o não pagamento da pensão. Refere-se o que ficou estabelecido no acordo de regulação das responsabilidades parentais, quais os valores que não foram pagos e qual o total em dívida.
Por regra, demora de 4 a 8 meses. |
Dedução automática | Exposição dirigida ao tribunal onde se relatam os factos referidos no mecanismo atrás mencionado. A estrutura do pedido é a mesma que a anterior. Aqui pede-se que o tribunal dê uma ordem à entidade patronal para esta deduzir automaticamente na folha de pagamento do progenitor faltoso e depositar na conta indicada pelo progenitor credor uma determinada importância relativa às pensões em atraso e outra relativa às pensões que se irão vencendo.
Esta solução é relativamente rápida de obter — cerca de 2/3 meses. |
Execução especial por alimentos | Muito semelhante, do ponto de vista formal, ao mecanismo anterior. Pode-se pedir a penhora de bens do devedor assim como o desconto automático no seu vencimento.
Em média pode contar com 3 a 7 meses |
Crime de violação da obrigação de alimentos | Queixa apresentada junto do Ministério Público com o objetivo de apreciar o comportamento do outro do ponto de vista criminal.
Este mecanismo tem consequências mais graves do que os anteriores porque pode implicar uma pena de prisão que pode ir até dois anos. Também aqui se relatam os factos referidos no mecanismo atrás mencionado. A estrutura do pedido é semelhante. Basta que haja um atraso de dois meses no pagamento da pensão para que seja considerado crime. Para cometer um crime que preveja prisão exige-se que os atrasos sejam constantes ou, não o sendo, que coloquem em causa a satisfação das necessidades fundamentais da criança. Solução mais demorada. Em média terá de aguardar 12 a 18 meses. |
O progenitor credor pode, por si só, expor esta situação ao tribunal. Não precisa contratar um advogado para o efeito, embora isso seja altamente recomendável.
Veja a estrutura de uma execução especial por alimentos.
COMARCA DE SINTRA INSTÂNCIA CENTRAL SEÇÃO FAMÍLIA E MENORES Exmo. Sr. Meritíssimo Juiz de Direito JOANA MARIA MARQUES VIDAL, divorciada, NIF 122323223 residente na Rua Adelino Bonaparte, n.º 2, Sintra, vem propor EXECUÇÃO ESPECIAL POR ALIMENTOS nos termos do art. 933.º do CPC contra, MANUEL TIAGO SAMOUCO SILVA, divorciado, NIF 112323445, residente na Rua Direita, sem número, Lisboa, o que faz nos termos e fundamentos seguintes: Exequente e executado são os progenitores dos menores MARIA INÊS VIDAL SILVA e PEDRO FREITAS VIDAL SILVA. 2. Nos autos do processo de Divórcio por Mútuo Consentimento n.º 222/13 que correu os seus termos na Conservatória do Registo Civil de SINTRA foi acordado e homologado o Acordo de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais de que se junta cópia e aqui se dá por integralmente reproduzido (doc. nº 1). 3. O referido acordo estabelece, no seu art. 11.º, que “as despesas escolares e com atividades extracurriculares dos menores, bem como as médicas e medicamentosas não cobertas pelo seguro de saúde (…), são suportadas na proporção de metade para cada um dos progenitores mediante a apresentação dos respectivos comprovativos das despesas, por quem as tiver realizado.” 4. Desde novembro de 2013 até janeiro de 2014 os menores frequentam o ATL do Centro BOM SUCESSO, tendo a Requerente pago €123,84 (docs. nºs 2, 3, 4 e 5). 5. De fevereiro de 2014 até julho de 2014, os menores frequentam o “INFANTÁRIO BEM CRESCER”, 6. Tendo a Requerente despendido para o efeito de €2.942,00 (docs. 6, 7, 8, 9 e 10). 7. No presente ano lectivo os menores frequentam o COLÉGIO DA SENHORA DO CARMO, sito na Rua D. Manuel Silva, em SINTRA. 8. Respetivamente, o 2.º ano e o Pré-Escolar. 9. Despendeu a Requerente €6.171,44 (docs. nºs 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26 e 27). 10. Montante este que inclui o lanche, os respectivos livros e ainda as atividades extracurriculares de judo e ginástica, além de outras despesas com elas relacionadas. 11. Apesar de instado diversas vezes, o Requerido nunca comparticipa em qualquer despesa escolar dos seus filhos menores como estava obrigado. 12. Deve o Requerido, por isso, metade das despesas escolares, na quantia de €4.618,64. 13. Além disso, desde a homologação do Acordo de Responsabilidades Parentais os menores tiveram, várias vezes, de se socorrer da prestação de cuidados médicos e ainda de medicamentos. 14. A Requerente foi pagando esses serviços e os medicamentos prescritos pelos médicos. 15. O valor dessas despesas ascende a €341,75 (docs. nºs 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 43, 44, 45 46 e 47). 16. Cabendo ao Requerido pagar metade, no montante de €170,86. 17. Apesar de instado para pagar esses valores o certo é que o Requerido nada pagou. 18. Encontrando-se assim a dever €4.788,64 referente a metade das despesas, escolares, extracurriculares, médicas e medicamentosas realizadas desde setembro de 2013 até à data de hoje. 19. A este montante em dívida acresce que o Requerido desde janeiro do corrente ano deixou de pagar a pensão alimentícia aos seus filhos menores no montante de €500,00 mensais. 20. Estando em dívida quatro prestações num total de €2.000,00 21. Nos termos do art. 933.º do CPC e face ao exposto deverá o Requerido ver o seu vencimento penhorado e adjudicado um montante para pagamento das prestações vencidas e as vincendas. 22. O Requerido encontra-se atualmente a exercer a sua atividade profissional na firma PLOSMATEX, Lda., com sede na Rua da Bemposta, 27, Lisboa, auferindo a título de salário, cerca de €3.500,00 mensais. Nestes termos, ao abrigo das disposições conjugadas do art. 189.º da OTM e do art. 2006.º do Código Civil, requer-se a V. Exª se digne mandar proceder à notificação da entidade patronal do Requerido para:
VALOR: €6.788,64 (seis mil setecentos e oitenta e oito euros e sessenta e quatro cêntimos). JUNTA: 47 documentos. A requerente, JOANA MARIA MARQUES VIDAL |
Tome nota que só poderá exigir o pagamento do valor estabelecido se o acordo de regulação de responsabilidades parentais (onde consta o montante da pensão e o responsável pelo seu pagamento) tiver sido homologado ou decidido pelo tribunal ou validado pela Conservatória do Registo Civil, no âmbito do divórcio. Um acordo apenas verbalizado pelos progenitores ou assinado por ambos não tem qualquer relevância para estes efeitos.
Também deve ter em conta que o progenitor devedor se pode defender perante o pedido efetuado junto do tribunal para a cobrança do valor em dívida. E, uma das estratégias usadas, é a de pedir a alteração do valor da pensão, alegando, por ex., que tem mais despesas ou ganha menos agora do que quando o acordo da pensão ou a decisão judicial que a fixou foi estabelecido (veja, para detalhes, o ponto em baixo ‘As circunstâncias podem alterar o valor da pensão’).
Se é o progenitor devedor, leve a sério a recomendação de não falhar o pagamento pontual da pensão. Se porventura se encontra em dificuldades financeiras, peça uma alteração ao regime em vigor, inicialmente, junto do outro progenitor e, se ele não aceitar a sua proposta, junto do tribunal. Não pagar a pensão depois de terem decorrido dois meses é crime. E ser condenado pela prática de um crime pode originar danos colaterais gravíssimos para si (por ex., no seu emprego).
Se o Banco de Portugal toma conhecimento da situação, todos os outros bancos irão registar as suas falhas de pagamento. E isso pode impedi-lo de aceder, no futuro, a crédito bancário.
No entanto, acima de tudo, o não pagamento impede que o seu filho aceda a determinados bens e obtenha certas experiências. No fundo, o não pagamento empobrece o seu filho. Isso, seguramente, deve merecer a sua reflexão.
O Fundo de Garantia dos Alimentos devidos a Menores
O Fundo de Garantia dos Alimentos devidos a Menores responde pelo pagamentos das pensões estabelecidas a favor das crianças quando os progenitores devedores o não fazem e quando não se conseguem cobrar as dívidas. Este Fundo tem em vista facultar às crianças condições adequadas para o seu sustento, educação e saúde, situação por demais compreensível supondo que, com a falta de pagamento das pensões, só existiria um progenitor a suportar totalmente as despesas dos miúdos.
É gerido pelo Estado e deve ser considerado um mecanismo de último recurso.
Para poder aceder a este Fundo terão de se cumprir, em simultâneo, três requisitos:
- o progenitor devedor está judicialmente obrigado a prestar alimentos a criança — há um documento do tribunal de onde resulta quem deve pagar e qual o montante a pagar;
- a criança tem de residir em Portugal;
- não foi possível cobrar judicialmente os alimentos em dívida;
- a criança não possui rendimento líquido superior ao salário mínimo nacional ou, então, a divisão dos rendimentos pelo agregado familiar onde ele se encontra não permite que lhe caiba, nessa divisão, o valor do salário mínimo nacional.
O valor da prestação suportado por este Fundo é fixado pelo tribunal. Ele não pode exceder, independentemente do número de crianças, o montante mensal de € 408. Pode ser superior ou inferior ao que o progenitor estaria obrigado a pagar mas, em caso algum, pode ultrapassar os tais € 408.
CASO PRÁTICO
Imagine que o agregado familiar onde se encontra a criança é composto por: — pai, que tem a residência da criança, e que aufere € 900; — companheira, que aufere € 650; — a criança credora. O total dos rendimentos deste agregado é de € 1.550. Este rendimento, de acordo com a lei sobre o Fundo, é dividido por 2,2 (1+0,7+0,5). O resultado é de € 704,5. Este valor é superior ao IAS (indexante de apoios sociais), isto é, atualmente, de € 419,22. Ora, como o valor da divisão (€ 704,5) é superior ao IAS (€ 419,22) então esta criança não cumpre um dos requisitos legais, pelo que não poderá receber uma pensão do Fundo. |
Na eventualidade de ter direito ao Fundo, o progenitor com a residência deverá dirigir-se ao tribunal e denunciar junto do Ministério Público a situação de falta de pagamento da pensão por parte do outro progenitor.
O Ministério Público, verificando o cumprimento dos requisitos, irá então redigir um requerimento que entregará ao juiz solicitando que o pagamento da pensão seja efetuada pelo Fundo. O tribunal irá recolher a prova adequada e, depois, tomar uma decisão.
Se for atribuído o Fundo e se é o progenitor com quem a criança reside tome nota que tem, anualmente, de renovar o pedido de pagamento da pensão pelo Fundo junto do tribunal. Para o efeito, deve apresentar a prova de suporte da manutenção dos pressupostos que justificaram o deferimento do pedido de pagamento pelo Fundo.
Considere ainda que o Fundo só se responsabiliza pelo pagamento das pensões que se venceram desde a data da entrada do pedido e já não por todas as pensões vencidas. Além disso, o Fundo só paga a pensão enquanto a criança é menor. Atingindo a maioridade a criança deixa de beneficiar dessa pensão, inclusive nos casos em que ainda se encontra a concluir a sua formação profissional.
Fale com um advogado. Por vezes, basta uma reunião para compreender que procedimentos deve adotar.