
A partilha de bens obedece a determinadas regras. Elas deverão ser seguidas tanto na partilha por acordo como na sem acordo.
Porque a sua partilha vai ser feita na sequência de um divórcio, mesmo que esteja casado no regime de comunhão geral de bens ela será sempre feita de acordo com o regime de comunhão de adquiridos (como já referimos, na separação de bens, tecnicamente, não existe património comum mas sim compropriedade, portanto, não há partilha mas sim divisão dos bens).
Que fique, desde já claro, o seguinte: partilha não significa a divisão (física) dos bens ao meio. Aliás, em alguns isso seria impossível (embora em outros isso até possa ser uma boa solução).
Partilha significa antes que, depois de inventariado o património comum, a cada ex-cônjuge será atribuído uma parte constituída por bens cuja resultado da soma dos valores será idêntico para ambos. No caso de não ser igual o valor (por ex., a si são ‘adjudicados’ bens no valor de € 250.000 e a ele de € 190.000, num património líquido total de € 440.000) então quem recebe mais terá de pagar ao outro a diferença (nesta situação, terá de entregar ao outro € 30.000, para que ambos fiquem, a final, com valores iguais — € 220.000).
Como o regime a aplicar é o da comunhão de adquiridos, mesmo tendo casado em comunhão geral, terá de acordar com o outro ex-cônjuge o que é património comum e o que é património próprio. Por isso é que os grandes temas em discussão quando se fala em partilhas, e pelos quais, provavelmente, será confrontado, são dois:
- A qualidade jurídica dos bens — são comuns ou são próprios?
- O valor de mercado dos bens.
O processo negocial iniciou-se com a listagem dos bens comuns e dos bens próprios — o inventário. Agora, vai procurar dividir esses bens, atribuindo uns a si e outros a ele.
Ambos estarão de acordo quanto aos termos da divisão na maior parte dos bens. No entanto, também é natural que existam desentendimentos quanto a outros bens (ambos querem ficar com eles ou não querem ficar com eles).
Para ultrapassar estes desacertos apresente propostas e contrapropostas — no fundo, negoceie. E, durante as negociações, não tome decisões repentinas. Receba a contraproposta do outro e deixe-a alguns dias de lado, para depois, mais tarde, olhar para ela serenamente e com um maior grau de objetividade.
Afaste sempre as emoções. Seja claro e conciso.
SUGESTÕES PARA ALCANÇAR UM ACORDO
Por vezes, é mais a atitude que o outro tem perante as questões colocadas do que a proposta em discussão, propriamente dito, que impede o consenso. Ainda por cima, com todas as emoções à flor da pele.
Veja algumas sugestões para que tudo corra pelo melhor.
- Pense que vai conseguir o que for possível e não o que ‘merecia’.
- Estabeleça desde logo o que está disposto a abrir mão, o que pretende obter e qual o seu limite.
- Não responda a provocações e não as promova! Seja claro e objetivo.
- Coloque-se, por vezes, no lugar do outro, para perceber se os argumentos apresentados fazem sentido.
- Conte até três antes de responder. E deixe passar alguns dias até apresentar uma contraproposta.
- Quando o ambiente começa a aquecer, utilize frases como:
- ‘Valorizo muito o que conseguimos até agora…’
- ‘Devemos resolver as questões com base em princípios e não na força…’
- ‘Ajuda-me a compreender como chegaste a essa conclusão…’
- ‘Estou a procurar compreender a tua proposta; podes explicar-me quais são os motivos?…’
- Avance por etapas. Se são conseguidos acordos em certos pontos eles que fiquem logo fechados.
- Incentive o outro a esforçar-se por atingir um acordo, referindo, por ex. ‘Eu aceito a tua proposta nessa parte apesar de não me ser favorável, porque…’
- Prepare-se adequadamente para as negociações. Vá com a lição bem estudada.
Se não se entenderem quanto a à qualidade dos bens e/ou o valor e/ou os termos em que a partilha seja feita, o mais provável é o processo ter de ser resolvido com a intervenção do notário e, mais tarde, do juiz.
ATENÇÃO: A questão de uma eventual pensão de alimentos para si ou para o outro é um tema que não tem cabimento na partilha. Não se discute neste âmbito. Seja como for, tome nota que a partilha efetuada pode influenciar a justificação para a existência de uma pensão bem como o seu valor.
Depois de se envolver e de se esforçar, com o apoio do seu advogado, poderá haver fumo branco. Sendo o caso, é feito o mapa da partilha. Veja o seguinte exemplo, retirado do inventário que vimos anteriormente.
MAPA DA PARTILHA |
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DESCRIÇÃO | VALOR | QUALIDADE | ELE |
ELA |
Fração autónoma T4 na António Augusto Aguiar | 800.000 | Comum | 800.000 | |
Moradia unifamiliar T3 no Bom Sucesso Resort | 390.000 | Comum | 390.000 | |
Range Rover Sport | 26.000 | Comum | 26.000 | |
Audi A6 | 32.000 | Comum | 32.000 | |
Time Sharing 1 semana Vilamoura Plaza | 22.000 | Comum | 22.000 | |
Conta bancária BPI n.º 6473637748 | 12.234 | Comum | 6.117 | 6.117 |
Conta bancária BPI n.º 0094785757 | 40.000 | Comum | 20.000 | 20.000 |
Conta bancária BIG n.º 88789 | 220.000 | Comum | 110.000 | 110.000 |
120.000 ações Millennium bcp | 10.800 | Comum | 5.400 | 5.400 |
1000 títulos de obrigações SEMAPA | 12.000 | Comum | 6.000 | 6.000 |
Quota Forsting Consulting – 30% capital | 150.000 | Comum | 150.000 | |
Plano Poupança Reforma | 8.970 | Comum | 8.970 | |
Descontos Reforma | 43.200 | Comum | 43.200 | |
Serviço de jantar Vista Alegre | 3.800 | Comum | 3.800 | |
Recheio da casa de Lisboa:
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22.500 |
Comum | 22.500 | |
Recheio da casa do Bom Sucesso:
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13.500 | Comum | 13.500 | |
Cartão milhas TAP | 400 | Comum | 400 | |
Passe entrada anual futebol | 90 | Comum | 90 | |
Crédito sobre o Fisco – ano anterior | 4.320 | Comum | 4.320 | |
TOTAL ATIVO | 1.811.814 | 805.997 | 1.005.817 | |
Hipoteca sobre a casa Bom Sucesso – Santander | 170.000 | Comum | 170.000 | |
Cartão de crédito — BPI | 2.780 | Comum | 2.780 | |
TOTAL PASSIVO | 172.780 | 170.000 | 2.780 |
RESUMO |
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Total ativo bruto | 1.811.814 |
Total passivo | 172.780 |
Total ativo líquido | 1.639.034 |
Valor a que cada um tem direito | 819.517 |
Adjudicado a Ele | 805.997 – 170.000 = 635.996 |
Adjudicado a Ela | 1.005.817 – 2.780 = 1.003.037 |
Tornas de Ela para Ele | 183.520 |
Totais Finais | Ele: 819.517 / Ela: 819.517 |
Neste caso, há bens que foram, pura e simplesmente, divididos (o caso dos saldos das contas bancárias, por ex.). Outros bens já foram adjudicados ou a si ou a ele (o que aconteceu ao apartamento de Lisboa e à moradia no Bom Sucesso).
No final do mapa a ele foram adjudicados bens no valor de € 805.997 e uma dívida de € 170.000. Daí que ficou com um património líquido de € 635.996. Por sua vez, a ela foram adjudicados bens no valor de € 1.005.817 e uma dívida de € 2.780. Deste modo, ficou com um património líquido de € 1.003.037. Como o valor líquido a que cada um teria direito (a chamada ‘meação’) seria de € 819.517 e tendo a ele sido atribuído € 635.996 e a ela € 1.003.037, então ela teve de entregar a ele € 183.520. Com essa entrega ambos ficam com uma posição patrimonial idêntica.
Os bens próprios não são partilhados, logo não são considerados neste mapa.
Atenção, que não basta chegar a um entendimento para que a partilha fique concluída. Relativamente a bens imóveis e outros que carecem de registo, a partilha efetuada terá de ser formalizada:
- Balcão de Divórcio e Partilhas — junto da Conservatórias, ligando o 211 950 500, ou Loja do Cidadão, em www.eportugal.gov.pt
- Notário — em qualquer gabinete de notário — veja onde estão em www.notarios.pt ou ligando para 213 468 176.
- Advogado — pode falar com o seu advogado. Ele tratará de todo o formalismo por si.
Na eventualidade de ter de fazer um empréstimo bancário com hipoteca para ter dinheiro para pagar as tornas tome nota que terá, também, na mesma Conservatória onde existe o Balcão de Divórcio e Partilhas, de se dirigir ao Balcão Casa Pronta ou Loja do Cidadão.
MUITO CUIDADO: Fazer a partilha, mesmo com a intervenção da Conservatória ou do Notário, não altera as condições do empréstimo que tem com o banco. Ambos os cônjuges continuam obrigados perante o banco da mesma forma como estavam antes da partilha se ter realizado. Por ex., não pense que, por ter ficado a casa para ele, que o empréstimo agregado à casa também passa a ser da responsabilidade dele. Isso não é bem assim. Portanto, antes de tomar uma decisão sobre os termos da partilha veja junto do banco como fica a sua situação por causa do empréstimo que também é da sua responsabilidade. Negoceie isto também com o outro.
Fale com um advogado. Por vezes, basta uma reunião para compreender que procedimentos deve adotar.